21- CHIARA DE VOLTA?
Tive um sonho revelador no dia 12 de março de 1961, um
domingo. Tenho esse sonho descrito em um caderno que guardo até os dias de
hoje, como a maioria das recordações palpáveis que me lembram Chiara.
Impressiona a inteireza do sonho, o desenvolvimento linear e sem desvios,
fazendo-me acreditar que aquilo era mesmo um aviso. Encontramo-nos, no sonho,
em um grande salão. Eu vestia um terno azul e olhava um jardim de inverno cheio
de pássaros e flores. Nesse jardim de inverno, imenso, um labirinto de arbustos
modelados. Depois, silenciosamente, ela chegou e me cobriu os olhos com as
mãos. Reconheci-a. Deu-me um rápido beijo no rosto, pegou a minha mão e
conduziu-me para sentar com ela numa poltrona de veludo vermelho. Serviu-me
delicadamente um chá e disse que estava próximo o dia em que voltaria de novo
para ser minha companhia. Seria por um tempo, indefinido ainda, mas seria
bastante para realizarmos juntos muitas coisas. Perguntei-lhe quando, e ela
disse que eu tivesse calma, na hora certa eu saberia, deveria ter paciência.
Depois daquela noite acreditei que a
teria de novo. Tive ainda alguns sonhos curtos em que ela reafirmava que
voltaria. Preparei-me ansioso para recebê-la.
Naquele ano de 61, nasceu minha primeira
sobrinha, Elizabete, filha de Laura e Tomaz. Transformou-se imediatamente no
xodó de minha casa. Primeira neta e primeira sobrinha; era a empolgação de
todos.
No ano seguinte, em maio, Tomaz resolveu
levar a filha a São Paulo para que seus pais a conhecessem. Fui nessa viagem
com eles: a minha primeira grande viagem. Fui tranqüilo, porque consultei
Chiara em um outro sonho, e ela me tranqüilizou: disse que eu fosse, porque
ainda não estava no tempo de ela voltar. Senti-me importante fazendo aquela
viagem. Foi a primeira vez que eu fiquei tanto tempo (quinze dias) longe dos
meus pais e de Matozinhos. Eu, que era empolgado com o progresso brasileiro, mesmo
sendo um pré-adolescente, fiquei mais ainda quando conheci São Paulo.
Durante a minha estada em São Paulo,
sonhei três vezes com Chiara. Senti-a perto muitas vezes, uma vez, inclusive,
como se ela fosse uma menina que eu vi numa sorveteria em Piedade, a terra de
Tomaz. O que me fez ter essa impressão, quase certeza, foi o repentino aroma de
gardênia no salão da sorveteria. No futuro eu sentiria muitas vezes essa
sensação em outras pessoas, reconhecendo minha amiga numa específica expressão
do rosto. Como se ela aparecesse disfarçada, e só eu pudesse perceber...
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